sábado, 16 de março de 2013

Tardes...


Dia solarengo em que finalmente o frio se parece desvanecer e o calor de dias mais risonhos me chega finalmente… 
O ânimo é diferente e a melancolia de um inverno exigente, também.
Aproveito o início de tarde para um almoço mais demorado, degustando a refeição e um sol que descaradamente me oferece a sua luz, embora com traços de timidez no que à temperatura diz respeito. Está agradável, ainda que seja impensável atrever-me a retirar qualquer uma peça de roupa que me reveste e conforta.
A meu lado, algumas mesas e cadeiras estão ocupadas de igual forma… Gente que sente saudade de calor, de bom tempo, de romper com uns meses de dias cinzentos e de dar largas a uma liberdade e a uma maior boa disposição. Em toda aquela gente, reparo com avidez… Ainda que os traços do vestuário evidenciem roupas escuras, quentes e de certa forma, condizentes com a altura do ano em que nos encontramos, a elegância é vista pelos meus olhos de um modo mais detalhado e atento. As tonalidades dos tecidos tornam-se estilos de pura classe, realizam na perfeição cenários de diferentes contrastes e permitem em simultâneo que os excessos de tecido que ainda combatem o frio, manifestem requinte, bom-gosto e cuidado aparentes. Agrada-me este ambiente…
Continuo degustando a minha refeição, sem pressa e sem vontade de que a mesma termine. Gosto de aqui estar, como se possível fosse, eternizar este momento. Volto a reparar nas pessoas e as reacções são em tudo semelhantes à minha. Centro a minha atenção em particular, numa jovem senhora que parece situar-se do mesmo modo que eu. Aproveita o momento, saboreia cada pedaço de alimento e ali permanece como se esperasse algo… Os óculos escuros que se aninham no seu rosto, não me permitem despir-lhe o olhar. É uma cara bonita, jovem ainda, mas de uma mulher feita e sem tiques de meninice associados. Distinta, elegante, convidativa…
Confesso que não me sinto com coragem para abordar alguém e muito menos a mulher que observo. Vergonha talvez, ou receio de que este momento que há tanto esperava se perca e me possa estragar o instante. Opto por continuar o meu sossego nesta mesa, nesta cadeira, brincando com o copo de sumo, trincando o gelo e permitindo-me a observá-la e a fantasiar.
Gosto como se senta, como se movimenta, como mexe os lábios enquanto mastiga… A perna traçada perfeitamente visível e revestida por meias pretas diante de uma saia vermelha, conferem-lhe um ar cuidado, prazeiroso. Os sapatos rasos são delicados, embora me pareçam tudo menos quentes ou confortáveis. Gosto como ela movimenta o pé, como o descalça  e volta a calçar na perna que se eleva sobre a outra. E fantasio de novo…
Apetecia-me estar ali horas, a observá-la como se pintasse um quadro mental na minha mente. Apaixona-me a postura, a forma como parece representar um papel que simplesmente é uma acção natural daquele momento. E queria, queria-a muito para mim. Vontade de fazer desaparecer todos aqueles que nos rodeiam e que apenas nos distraem e desviam a atenção. Quero-me concentrado nela, na vontade de a contemplar e de a tornar minha… Confesso que me apaixona pelo que vejo e não pelo que me faz sentir. Revejo-me no papel de um verdadeiro amante, cuja adrenalina do momento proibido e eventualmente condenável, me aumenta a excitação, o desejo e o prazer de a possuir. Não sei se terá alguém ou se pura e simplesmente viverá só. Imagino-a apenas com um sinal endereçado a mim sob qualquer forma e como que a dizer… “VEM”. E sim, fecho os olhos e sigo-a até uma casa qualquer. Apenas quero um abrir de portas para me receber e um trancar das mesmas para me aprisionar. E sim, uma vez lá dentro, tudo nos seria permitido… Volto-me a elevar diante de tão sórdidos pensamentos. Quero-a, quero-a exactamente assim! Quero entrar por entre quatro paredes e consumi-la.
Não páro um só instante... Os meus devaneios aliados a um estado de espírito conferem-me altivez e uma postura que há muito desejo alcançar. Confesso que não me importo se ambos poderemos ter as vidas sentimentais preenchidas. Aliás, nem se trata de repartir corações ou de ir em busca de algo a que a suposta novidade é aguçada pela curiosidade. Há muito que desejo uma amante daquela forma e daquele modo, tenha alguém a meu lado ou não. Quero-a para fazer minha, para a tornar parte de mim, usando-a pela carne sem nunca abdicar do amor que inevitavelmente sentirei que me fará provocar. Simplesmente, desejo amá-la desta forma, dando-me, entregando-me, exigindo e querendo a mesma louca rendição apaixonada e sem compromisso.
Vejo-a levantar e faço por segui-la... Persigo-lhe o rasto pelo olhar, pelo aroma, pelo sabor que a minha boca quase sente ao desejá-la em mim. E volto a querer estar com ela. Sinto fome de  a ver entrar numa qualquer casa, de tocar à campainha e de ser recebido por entre a tal porta que se abre e fecha à velocidade dos nossos intentos. E quero roubá-la para mim, despi-la, trincá-la e lambê-la pedaço a pedaço, na mais ínfima e impiedosa forma de amar. Desejo a mesma loucura, a mesma insanidade do seu toque, da sua boca, dos seus lábios, da sua lingua... Das provocações baratas e excitantes que sempre nos elevam a um estado superior de entrega e sensações... Apetece-me viver o momento, com a pressa da exigência e da satisfação, em simultâneo com o retardar do tempo para um melhor e mais perfeito sentir. E quero, quero muito repetir... Por agora, por hoje, pela eternidade... Reprovem-me o acto, a loucura, a indecência. Culpem, punam e julguem a minha atitude condenável e quiçá reprovável, aos olhos dos outros.
Assumo convictamente que a vontade de ambos jamais seria a de ferir os sentimentos de alguém com quem pudéssemos partilhar as nossas vidas naqueles precisos instantes,  não negando no entanto que o desejo partilhado consistiria numa entrega sem reservas e onde constataríamos que o mesmo nos alimentaria e satisfaria de um modo inequívoco e verdadeiramente único.
Sinto-me capaz de a amar pela incondicionalidade do amor que a esta distância ela me produz. Acredito ainda que alimentado de uma forma mais visível e menos proibida, dificilmente poderia crescer e ser tão intenso como o é e sinto estar a ser. Adrenalina, desafio, carência... Chamem-lhe o que quiserem... No entanto e por dentro, bem no meu íntimo é bem mais do que uma vontade física de saciar vontades. No fundo, é disso que os verdadeiros amantes se alimentam... De uma paixão avassaladora bem maior que uma carência física ou necessidade de novas sensações. E nessa paixão insiro-me e acometo-me com a maior das verdades: a minha própria!
Rapidamente o meu olhar e o meu pensamento regressam à realidade e me levam a seguir pelo trilho habitual. Jamais poderei ter a certeza de a voltar a ver, mas em tudo e por tudo, alcancei uma certeza por hoje... Desejo e quero muito viver um amor desta forma. Para sempre...


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